Enquanto as ideias de psicologia e psicanálise florescem nos EUA, James Dean, nesta obra de Elia Kazan, carrega no corpo as renovações culturais de uma nova geração.
Algo interessante de notar é como o conjunto de técnicas de atuação popularmente chamado de "O Método" se populariza no cinema dos EUA ao mesmo tempo em que as ideias da psicanálise e psicologia tornam-se mais fortes no país. Essa é uma das evidências de como o sistema para atores formulado por Lee Strasberg é uma psicologização do Método das Ações Físicas (o sistema de Stanislavski). É um engano, então, atribuir ao estilo renovador de atuação praticado na escola em que James Dean se formou simplesmente uma importação do método do mestre russo, visto que sua "versão americana" praticada no Actors Studio gira em torno de um único aspecto psicológico do velho método de Stanislavski, a memória emotiva.
E por quê digo isso? Não para afirmar que Dean utilizava memória emotiva em seu trabalho, pois isso somente ele poderia responder (mas é fato que o ator estudou no Actors Studio dirigido por Strasberg), mas sim porque os filmes hollywoodianos estrelados por grandes nomes do Actors Studio deste período revelam o entusiasmo com o florescer das ideias de psicanálise e psicologia analítica nos Estados Unidos, incluindo (e especialmente) os filmes em que Dean atuou (como a obra prima de Nicholas Ray, Rebel Without a Cause).
"East of Eden", de Elia Kazan (um dos fundadores do Actors Studio) é muito marcado por esta faceta psicológica. Boa parte de seu drama inicial se estabelece a partir de uma construção unilateral das personagens do pai e do irmão do protagonista, Cal, que mais tarde revela-se como uma "pose" e não o verdadeiro self desses personagens. Explico: a aparente absoluta pureza do pai de Cal e de seu irmão não demonstram quem realmente são, mas, ao contrário, escondem algo que o protagonista e sua mãe exuberam: sua sombra. Cal e seu drama maternal levam todos estes personagens ao encontro com a própria sombra, testando os limites de sua pose de bom moço, visto que a bondade e pureza absoluta são ilusões, considerando que até mesmo o protagonista do filme demonstra isto (não sendo nem mau, nem bem intencionado).
Logo, a incompreensão que Cal sofre de seu pai e irmão representa a dificuldade que uma antiga geração tem de compreender os problemas psicológicos e as soluções da nova geração que surge (pautada nos ensinamentos de Freud, Jung e outros), trazendo iluminação quanto aos sofrimentos coletivos e individuais a parir da psicologia. Esta incapacidade de entendimento é o que leva ao drama final, em que, confrontados com a realidade esmagando suas idealizações (Aron descobrindo quem é sua mãe e enlouquecendo, e seu pai em choque com o estado de seu filho), os familiares de Cal não conseguem enfrentar o lado obscuro que, como parte natural da vida, emerge para eles. Por isso, sua pose de bondade demonstra-se sua maior fraqueza, apesar de que, eles próprios, não parecem conscientes disto.
Assim, retornando um pouco ao trabalho de Dean como ator, podemos enxergar como ele é também coautor nos filmes em que participa. Claro que a visão criativa do todo da obra está sob tutela do diretor, mas as câmeras daqueles que filmam Dean inevitavelmente se inspiram por seu estilo de atuação e pela construção de suas personagens. A desestabilização que Kazan constrói a partir de planos holandeses (câmera enquadrando os atores na diagonal) nos diálogos entre pai e filho carrega o próprio desequilíbrio emocional de Cal, bem como suas composições muitas vezes marcadas por sombras L(também, normalmente, dentro da casa da família de Cal) exalam a sombra tanto de seu protagonista como de todas as personagens, que é parte da anunciação trágica do final do filme.
Além da postura vibrante da mise-en-scène de Kazan em relação à composição de Dean, sua personagem está deslocada também por seu estilo de atuação que, renovador, é também contrastante, semelhante ao que ocorre com Marlon Brando em "Um Bonde Chamado Desejo" (em que seu modelo de atuação, com respiro e naturalidade, contrasta com outros do elenco): Dean carrega uma naturalidade e exposição emocional que não se percebe em seus parceiros de cena. Esse deslocamento funciona muito bem para sua posição de jovem rebelde, ferido e incompreendido. Sua personagem representa, a partir de seu estilo único de atuação, as mudanças culturais e científicas que revolucionavam os Estados Unidos daquele período e que invadiam as histórias contadas através da sétima arte.
Porém, talvez o mais interessante é que, ainda que com toda essa veia psicológica ou psicanalítica, o filme encerra-se como um bom melodrama assumido. O pai de Cal consegue superar as limitações de sua condição traumática pelo amor por seu filho, pelas verdades emocionais que emergem não do perdão religioso que ele tanto colocava sobre seu filho, mas do amor incondicional e compreensivo.
Assim, como este símbolo de uma nova geração marcada por novas complexidades culturais, o protagonista de James Dean precisa ser compreendido muito além do maniqueísmo de "bom" ou "mau" que regia a moral daqueles ao seu redor; e Elia Kazan encontra na profundidade emocional do melodrama as verdades que levam ao amor incondicional que dispõe de julgamentos, distante do maniqueísmo racionalista - o que mais seria a cena do beijo final entre Cal e Abra, que até então era noiva de Aron, se não a representação visual absoluta da vitória do amor profundo e da verdade emocional do self sobre o moralismo?
Nota do crítico:
Para mais críticas, artigos, listas e outros conteúdos de cinema fique ligado na Cine-Stylo, a coluna de cinema da Singular.
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